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VEREDAS DA PSICANÁLISE POLÍTICA

JANUÁRIO, Sérgio S.

Mestre em Sociologia Política

 

 

Há tempos, nos anos 80, os diálogos sobre Política transcorriam pela necessidade de se alcançar alguma forma de estabilidade econômica [eram muitos planos econômico] e em torno da exigência de se organizar o país para superar o período autoritário [Emenda Dante de Oliveira e Assembleia Constituinte]. O indispensável neste período era concretizar a transição política. Não era a verdade que estava em jogo, mas a necessidade de organização do país: pela democracia e contra a inflação.

Há tempos, nos anos 90 conseguimos votar para Presidente da República [Collor de Mello, Itamar Franco]. Após algumas decepções alcançamos estabilidade econômica [URV/Plano Real] e política [Reeleição e as Leis de Responsabilidade Fiscal]. Tínhamos dado os primeiros passos para viver um período de desenvolvimento estruturado em Políticas de Estado. Não era a verdade que estava em jogo, mas o Desenvolvimento Econômico e Progresso Político.

Há tempos, no início do século, passamos para Políticas de Inclusão Social. As Políticas de Governo [algumas se transformaram em Políticas de Estado] passaram a organizar Políticas Sociais de Inclusão e também uma variação de Capitalismo de Estado [quando o Estado passa a ser uma Organização Político-Econômica com empresas estatais e intervenção econômica fortes].

Emendado neste contexto, a década de 2010 passou a ser de crise moral na política com o advento das operações da Lava-Jato e os primeiros julgamentos e condenações de políticos “de grande porte”. Descobriu-se que, de dia e de noite, havia uma enormidade de processos de corrupção mirabolantes, sem limites, com desvios de recursos e conturbações éticas inimagináveis. A centralidade do debate se transformou em comportamento de confronto e vingança. Inclua-se aí o comportamento eleitoral que elegeu o atual Presidente.

Nessa mudança, o ex-juiz Sérgio Moro fora aclamado como herói em faixas nos protestos de rua, Bolsonaro fora designado para eliminar os” bandidos políticos” e a população olhara para a política com semblantes já envelhecidos pela ira. Não era a verdade que estava em jogo; Corrupção, Punição e Combate se tornaram elementos centrais na política.

Um pouco mais adiante, nos encontramos na política centrada na moralidade da verdade. Tudo o que ocorre neste momento está voltado para o que é verdadeiro contra o maquiado, o que é fakenews e o que é “realidade”. Os malabarismos sobre a verdade e a flexibilização das interpretações dos fatos têm nos levado a reduzir o debate político às preferências pessoais ou grupais, e não para as análises de fatos.

Como um diálogo entre dopados sociais, nos agarramos primeiro aos vínculos políticos e nos esquecemos de usar a racionalidade lógica para pensar os fatos. Cloroquinas, PF ou Polícia Federal, Proteção Pessoal/Filhos/Amigos, Isolamento Social ou Liberação Vertical frente à pandemia, Terra plana, tudo isso existe em confronto, e não como reflexão intelectual para se pensar as coisas que nos rodeiam.

Nisso tudo, a necessária brandura da verdade e a possibilidade de diálogo maduro perde espaços para a acusação, gritarias, ofensas, descontroles e passionalidades. Como um surto psicótico, berramos contra os discordantes de meu narciso que revela meus temores. Nossas conversas transitam em campos de violência e obscurecem o bom senso. A Política está a se fazer por confronto de destruição do adversário e não para o desenvolvimento e a esperança e, há tempos, não é um campo para o diálogo divergente. E a corrupção permanece, agora na modalidade de respiradores.

Está nos faltando a modesta inteligência. Já não sabemos qual é a medida da maldade, e o encanto para o amanhã está ausente.

 

Sugestão de trilha sonora: Há Tempos

Artista: Legião Urbana

Álbum: As Quatro Estações

Data de lançamento: 1989

 

Imagem: Pinterest



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