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UM GOSTO AMARGO DE CINZA NA BOCA

JANUÁRIO, Sérgio S.

Mestre em Sociologia Política

 

 

Uma semana, rigorosos sete dias sem nenhuma conturbação, ou surpresa. Uma semana de descanso para o destino. Luiz Inácio Lula da Silva foi preso e os dias seguem; a Suprema Corte não votou qualquer causa sobre a condição de prisão a partir das instâncias de investigação e julgamento ou a segunda instância; nenhuma nova fase da Lava Jato causou suspiros ou provocaram olhares escandalizados. Nem mesmo pesquisa de intenção de voto pareceu ser atrativa no domingo. Sobraram os ataques à Síria como fenômeno relevante.

Apesar de tudo isso não há tranquilidade política, nem saciedade democrática. Os resultados da pesquisa DataFolha asseguram essa afirmação. Temos a constatação simples de que sem tormentos e dramas não reagimos. Sem confrontos parece que nossa democracia não faz sentido nem desenha o futuro. Em nossa cultura política precisamos sempre recarregar as nossas energias com fatos e notícias negativas para ativar nossos desejos de que tudo pode melhorar.

Isso, por um lado, indica que somos incapazes de construir a nosso favor o futuro que desejamos. Precisamos nos opor a algo, a pessoas, a indulgências, a desafios para dar o passo seguinte. Vivemos na política e construímos a política como fenômenos de guerra e combate, não como ajuste de rumo ou compreensão de que temos força para sobrepor o positivo, o conquistado, fazer ainda o melhor de nós.

Críticas sempre serão saudáveis e devem ensinar novos caminhos e preparar nosso espírito para o que nos é diferente. Sempre será saudável se nos chegar como alerta e não como enfrentamento de nossas certezas. Certezas serão sempre burrices no aspecto democrático como Verdades serão sempre imposições.

O que ocorreu na última semana foi o fato de que tivemos que nos motivar por nós mesmos, sem esperar que qualquer infortúnio externo nos revelasse nossa indignação com o mundo político ou com a guerra jurídica. E é justamente por este posicionamento que constatamos diante de nós a ausência do novo, do renovado, ou do diferente. Não há candidato à Presidência da República que seja representante do dia de amanhã. Todos eles estão com os pés fincados em terrenos inseguros, ou estiveram de mãos dadas com líderes ou grupos hoje condenados ou sob suspeição. Estão, de muitas formas, comprometidos com o que existe, e pouco inspirados no que devemos mudar intensamente para melhorar nossa existência.

Quando deputados ou ministros de Estado não foram capazes de levantar a voz contra as condições de existência política do Congresso Nacional e perderam muitas oportunidades de falarem antes, como ministros ou deputados, o que dizem agora como pré-candidatos.

Mas como precisamos sempre acreditar no que temos como esperança, passou um tanto desapercebido a atitude de Joaquim Barbosa, ex-ministro da Suprema Corte e que cravou o “Mensalão” como ato criminoso. Inaugurou a condenação de políticos em série, quase sempre de cabeça erguida, voz firme e em pé. Uma luta herculana. Agora está filiado a partido político e pode concorrer à Presidência da República.

Não há novos líderes políticos [e o PT se atormenta na busca de planos “b”, “c”...]. Se Lula está preso e impossibilitado de concorrer à Presidência da República, e se Fernando Henrique Cardoso nem cogita em assumir posição de pré-candidato [em atitude estadista], resta acreditar que poderá haver justiça na ação política, ainda que seja fundamental que ações políticas sejam criminalizadas pela legalidade e pelo senso de justiça.

Está na hora de eliminar os fantasmas da república que pavimentam ruas mal-assombradas e trocam a esperança por fantasmas nos percursos da democracia. Está na hora de acabar com o gosto amargo de cinza que fica na boca durante a ressaca política.

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