PRATELEIRA DE CARGOS E ESTOQUE DE PODER

JANUÁRIO, Sérgio S.

Mestre em Sociologia Política

O estuporado Presidencialismo de Coalizão, uma estrutura de Estado capaz de existir, mas não ser presidencialista e nem parlamentarista, é cheio de deficiências por obrigar uma terceira modalidade de poder institucionalizado: a Articulação Política.

A Articulação Política decorrente do Presidencialismo de Coalizão produz um efeito pernicioso pelo qual o Congresso Nacional eleva o poder de veto como forma de pressão aos projetos de origem do Governo. Como necessidade, este último passa a articular, não os projetos que propõe, mas as pressões que sofre por “alinhamento político”. Não é a dor que sente que faz o Executivo se contorcer, mas a que teme sentir; enquanto que o Parlamento se agiganta pela ameaça.

O Detentor do Poder Político de Cargo Executivo, embora “passageiro do assento” – ainda que alguns tentem se perpetuar, passa a realizar trocas de votos relativos a seus projetos por cargos e postos políticos. E os Partidos Políticos, que deveriam fazer a representação dos interesses dos grupos dos quais são oriundos, tornam-se um fim em si mesmos e procuram benefícios, privilégios, controle sobre orçamento público ou postos de negociação com empresas prestadoras de serviços ao Governo.

O Patrimonialismo, prática que se instala no Brasil desde a colonização, se perpetua e progride até nossa época, se traduz na forma de tornar privado e individual [como a propriedade privada] o que é público e coletivo [res-pública, uma forma de Estado que se faz em nome do interesse coletivo e comum ou em nome da ‘coisa pública’]. A quantidade atual de “Cargos Comissionados” que são de indicação do “dono temporário do poder” se transformaram nas vísceras do Patrimonialismo e servem como elemento de troca, manipulação e “geração de consensos”. É um estoque de poder político. O interesse público se existir, será encontrado no fim da fila. Temos, hoje, as narrativas mais devastadoras sobre os resultados da Articulação Patrimonialista: corrupção política.

Atualmente, o Patrimonialismo foi convertido na representação da “Velha Política”, ainda que não tenhamos inaugurado a “Nova Política”. Estamos no período da Política de Enfrentamento, procurando resistir aos embalos dos privilégios, ao engodo das trocas votos/cargos, à cessão de postos de tomada de decisões a mercadores políticos. Política de Enfrentamento que institui o revide a agressões pessoais, que rejeita os recados da arrogância do “dono” de um lado para com o “funcionário” de outro.

Ao mesmo tempo, um Governo cheio de fragilidades organizacionais, destemperos pessoais, sem projeto unificador, sem linha de política de desenvolvimento [mas de correção de rumo]; Governo que se alimenta do passado, fundamentalmente dos erros e desvios éticos do PT e do conflito com os petistas e seus aliados; um Governo baseado na busca de padrão ético ainda indefinido em si mesmo porque se faz em oposição ao passado [sabe o que não quer ser, mas tem dificuldades de definir o que deseja ser por si mesmo].

Por estarmos num período de transição – com um ponto de partida, mas sem ponto de chegada – é necessário ficar atento às “Articulações” entre o Poder Executivo e o Poder Legislativo. É do conteúdo do que se traduzir da “Articulação Política” entre Congresso e Governo que saberemos o caminho trilhado na política atual. Estamos no fio da navalha, sem opção pelo talvez, pelo mais ou menos.