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O VOTO DA POLÍTICA COLONIAL NA URNA ELETRÔNICA

JANUÁRIO, Sérgio S.

Mestre em Sociologia Política

 

Desde o início de nossa existência “civilizada”, com as mãos e ideais europeus no continente americano, a Colônia Portuguesa na América foi assumida como espaço de exploração. Daqui tudo o que era coletivo [numa referência de que não é de ninguém, senão daquele que chegar primeiro] serviria para sustentar os privilégios aristocráticos das “Nobreza Monárquica” e que agiam com a preocupação do umbigo para cobrir sua ambição pessoal e sua posição na estrutura de poder e privilégios.

Não nasceu aqui um Estado Republicano com o princípio do bem comum, do comunitário, das coisas do povo, senão dos privilégios da aristocracia monárquica. Até hoje apresentamos os melhores como Reis disso ou daquilo, atitude e comportamento próprios de uma construção social e política desde nossa origem de colônia de exploração. Em boa parte, por isso, ainda cultuamos valores de hierarquia aristocráticas, tal qual quando um vereador ou deputado aclama outro como “Nobre isso”.

O que veio a estruturar nossas camadas políticas foi o Patrimonialismo, uma forma de se compreender as formas de existência política como algo pessoal, inspirado na exploração colonial, na base de que o bem coletivo deve assegurar a ambição pessoal pelo poder e pela riqueza individual do “dono” do poder. No Patrimonialismo assumimos que o Presidente da República pode fazer o que quiser, implantar seus desejos. Legitimado pelo voto, o Presidente poderá dizer o que quer a partir de si mesmo. Como um rei que conjuga seus desejos como se fossem o interesse coletivo, implanta em seu corpo a designação de um país.

Esse Patrimonialismo figura como Autocracia, um regime no qual prevalece as vontades pessoais ante a legislação, a necessidade de se prestar contas dos atos, a virtude da transparência facilitada. Num mundo nebuloso que pretende se esconder da virtuosidade da Democracia, toda a transparência tem que ser buscada pelos arqueólogos da investigação judiciária, tirando as camadas que encobrem as sujeiras de um arranjo complexo de falcatruas, delitos e roubo dos bens públicos.

Com a Transparência sendo descoberta, no exame das camadas que encobrem as sujeiras do Patrimonialismo, da Autocracia e da Corrupção, ficamos a aguardar as cenas das próximas semanas a serem apresentadas pela mídia: as próximas cenas de prisão, as próximas buscas em apartamentos, as sequenciadas apreensões de computadores, telefones e documentos.

Tais arqueólogos da política brasileira correspondem aos portais da transparência, que nunca transparecem a realidade umbilical dos “Nobres disso ou daquilo”. Complexo e indecifráveis, o Portal da Transparência da “Aristocracia Monárquica”, dos “Reis” e “Condes” e “Viscondes”, sempre comissionados pelo arranjo do dono do poder, precisam de esforços “sobrenaturais” para serem compreendidos.

Até mesmo o voto é assumido como uma atitude individual. Como parte fundamental da política, o voto vira foro individualista, como se nada tivesse de implicação para os outros. O voto, como ato individual, é um espelho narcisista, um patrimônio pessoal pelo qual os votantes podem procriar vantagens patrimoniais. Eleitores assim, não fazem mais do que prolongar a cultura Patrimonialista, valor circulante da Autocracia e da Corrupção. Desde o eleitor, é preciso deslocar o voto para seus efeitos coletivos, como um ato de coisa pública e com a transparência política necessária para o bom debate e o elementar desenvolvimento.

Voto trocado por vantagens pessoais eleva os mesmos princípios da Política Colonialista de Exploração, da Corrupção, do indigno obscurantismo do umbigo sujo. A despeito da Urna Eletrônica como símbolo de desenvolvimento tecnológico da política brasileira, o voto ainda é uma vantagem e não uma responsabilidade com os outros.

 

Sugestão de Trilha Sonora: MORRO VELHO

Autor: MILTON NASCIMENTO

Álbum: ELIS

Data de Lançamento: 1977

Crédito de Imagem: Pinterest

 

A canção "Morro Velho" retrata a permanência da estrutura e da cultura de desigualdades sociais que estão na formação de nossa identidade política e econômica. Tal como replicamos a estrutura social e política do voto, está atualizada em nossas práticas.



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