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O MEDO DE TER MEDO

JANUÁRIO, Sérgio S.

Mestre em Sociologia Política

 

 

Tememos muitas coisas! E é da natureza de nossa existência termos medo. Precisamos ficar alertas para tudo o que nos ocorre e que possa colocar em risco a nossa vida. Este é o medo instintivo que reconhecemos também em outros animais. Cada um de nós já deve ter visto animais selvagens que ficam com as orelhas, narinas e olhos em busca de se sua autodefesa. É uma vida de tensões permanentes porque precisam recorrer a todos os sentidos conjugados para fugir dos predadores. Predadores sempre externos. E suas habilidades de proteção e fuga são desenvolvidas no desempenho físico [velocidade, saltos, curvas bruscas...].

O medo humano reside também no seu efeito social [Bauman]. Primeiramente na maneira de sua educação familiar ou a forma de acesso ao convívio com outros e com a sociedade. Ali são traçadas as formas segundo as quais cada um de nós vai receber os padrões de como ver o mundo [filosofia de mundo] e de se ver no mundo [filosofia de vida]. A carga recebida constrói, como tijolos, o ser a existir em todas as suas fases de vida. Os relacionamentos com os outros será aplicado a partir dessas credenciais sociais interiorizadas. Começa a nascer o ser social.

Somos formados para viver com a interiorização do que está ao nosso redor, entendendo como o mundo funciona ali fora. Precisamos estar atentos a tudo. E como somos seres sociais, nascidos para viver em grupo, para falar [uns falam mais do que os outros], precisamos ter um modelo de como o mundo em que vivemos está organizado. Temos muitos auxílios, como a Religião, a Escola, a Família, o Trabalho, os Governos, as Regras de Trânsito, enfim, todas as instituições que nos orientam para a vida social. Elas estão incorporadas, colocadas no interior de nosso corpo.

Mas as formas de compreender, aceitar e usar esses mecanismos sociais são também construídas, tijolo a tijolo, quando ingressamos no mundo. E como as instituições são diferentes em cada grupo social, em intensidade e em extensão, dizemos que cada grupo forma sua cultura. Essa forma de responder e interagir e sentir e agir com o mundo é o processo de exteriorização do que acreditamos ser o mundo.

Então, como a vida é uma engenharia inexata de interiorização e de exteriorização contínuas [Bourdieu], entendemos as pessoas que agem no mundo e sofrem ações desse mesmo mundo, de acordo com o jogo social e com o desempenho que o agente elabora no jogo. O ego fica relativamente controlado para se viver em grupo, mas as vezes se projeta como criança não iniciada: seu desejo e medo viram gritaria e violência.

O medo, que originalmente é instintivo, revela-se também social. A educação que recebemos logo em nossa infância, os nãos às crianças [limites sociais], os aplausos que colhem [motivações ao social] vão elaborando o caráter social de cada agente dentro de sua cultura. Se este tratado educacional recorre à violência simbólica ou física, os agentes entenderão que a forma de reagir aos riscos e perigos será com violência; se a hierarquia imperativa é regra durante a infância, o mundo será acionado por minhas ordens [ledo engano].

Adultos cuja atitude e comportamentos sejam agressivos traçam hoje os caminhos que assumiram lá atrás. É pela educação social e formal que estabelecemos agentes fortes, democráticos, respeitosos, empreendedores, de moral altruísta... É pela educação social e formal que criamos seres frágeis, covardes, medrosos, desrespeitosos, egoístas, soberbos, autoritários, arrogantes... Só que, quando adultos, somos responsáveis por nossa conduta social e culpados pelos erros que comentemos: a sociedade não será acusada por isso, apesar de sofrer as consequências disso. A trajetória social de cada um revelará o currículo de vida.

Para os adultos, o auxílio primoroso da psicologia tem sido a porta que se abre para dentro de cada um e que, ao revelar quem somos e como chegamos até aqui, é capaz de provocar mudanças de filosofia de mundo e filosofia de vida nos agentes. Para a nova geração, o processo educacional tem sido a linha de democracia social para a evolução do ser social e, oxalá, da espécie. Ministros, Secretários de Governo e de Municípios precisam ser os mais bem preparados para viver em sociedade: sua missão é de Hércules. Contra o medo, a Educação com todas as suas caras.

 

Sugestão de Trilha Sonora: DANIEL NA COVA DOS LEÕES

Artista: LEGIÃO URBANA

Álbum: DOIS

Lançamento: 1986

 

Crédito de Imagem: Pinterest



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