LAVA-JATO: DO JUSTO E DO LEGAL
JANUÁRIO, Sérgio S.
Mestre em Sociologia Política
Apesar de nossa vida social ser regrada por instituições formais – aquelas constituídas em aspectos estruturais burocráticos como escolas, empresas, governos, religião, sindicatos etc. – e instituições informais – aquelas cuja organização se efetua por criações espontâneas da sociedade como grupos de amigos, comunidades, grupos de pescadores, de vizinhos etc. é a combinação entre o formal e o informal o que exige transformações sociais e políticas.
As instituições formais são criadas por regras escritas, com critérios explicitados para integrantes, limites de operações; têm registros em estruturas de controle e limitadas pelas condutas expressas em leis. As leis, criadas em fóruns legais, estabelecem as formas e conteúdo de funcionamento, ao mesmo tempo em que fiscalizam e punem independentemente dos membros e seus status sociais. As leis estão acimas dos membros e de suas condições sociais; são regras gerais e superiores. São os fundamentos do Estado de Direito.
As instituições informais são voluntariamente geradas e as regras de funcionamento e de ingresso são compostas sem registros oficiais; operam dentro de normas basicamente espontâneas, e as formas de controle e fiscalização funcionam de acordo com os pactos criados pelos próprios membros. Não há registro oficial de sua existência, mas o reconhecimento social e político de sua vida são claramente observados e preservados. Tradições e organicidade são os pilares de sua existência e de sua manutenção.
A depender dos contextos e das situações podemos conjugar fatos que são justos e ocorrências que são legais. E, não eventualmente, das coisas que são justas e legais ao mesmo tempo. Isso se revela nas intercepções de conversas privadas sobre fatos públicos ou privados. Reserve-se a condição de que a invasão de ambientes privados é notoriamente ilegal e que os indivíduos-cidadãos devem ser protegidos pelo Estado em sua privacidade: é lei.
A Lava-Jato em geral, e o ex-Juiz-atual-Ministro Sérgio Moro foram alvos que contornam as posições do justo e do legal. Reserve-se também o fato de que a invasão de privacidade foi imputada aqui com pretenso pretexto de proteção unilateral: apenas um lado foi “grampeado”. E ainda que há indicações de manipulação ou criação de conteúdos posto que não reconhecido pelos invadidos; que há diferença de titularidade entre os protagonistas dos diálogos; e que um mesmo emissor emite mensagens diferentes no mesmo segundo para pessoas diferentes. Por outro lado, os conteúdos são de interesse público a despeito da forma de obtenção.
Para uma parte da população os resultados alcançados pela Lava-Jato são condições suficientes para tornar justos os meios empregados. De um modo ou de outro interromperam um complexo processo de corrupção Político-Empresarial que usurparam recursos públicos como nunca antes registrados na história da civilização moderna. Justo porque, no encontro de delações e pela coleta de provas, ficara indelével a maracutaia que sangrou com fome, doenças, mortes as políticas sociais que outrora fora fonte de condição de “esquerda”. Justo também porque a luta da Lava-Jato se dera na descoberta das negociatas de um lado, e dos trâmites burocráticos entre níveis de esferas de julgamento formal, de outro. Justo porque encontra na maioria da população a legitimidade de sua defesa.
Para outra parte da população, envolta na defesa de um político carismático, a luta da operação Lava-Jato tivera um alvo único e uma intolerância pessoal contra um líder aclamado em um país dividido entre o bem e o mal, entre o certo e o errado, entre os trabalhadores e a elite. Tal maniqueísmo é a fonte de força e esperança do atual governo, o qual inverteu os polos dos ocupantes. E quanto mais ardente a fogueira da inquisição mais intensa a pureza a ser alcançada das almas-políticas.
Algo está consolidado: haja o que houver Sérgio Moro, pelo símbolo que se tornou, carregará consigo a espada da justiça social legitimada pela descoberta e aniquilamento de processo de corrupção integrado em redes “estruturadas”. Redes tão bem elaboradas que virou setor de atividades de grandes empresas, que formou doleiros especializados em disfarces financeiros, que criou políticos cujo poder estava no acúmulo monetário regado a vinhos e cardápios desdenhosos do sofrimento em filas de emergências de hospitais.
Há leis que pegam, quando legitimadas pela população e há condutas legitimadas pela população que pegam nas leis. Inscrevem, assim, a combinação entre o justo e o legal. Esta tem sido a forma da Política de Enfrentamento dos eleitores, visto os resultados eleitorais. E a única coisa estável na política brasileira é a instabilidade capaz de exigir mudanças.
Crédito de Imagem: Google Imagem/Justo e Legal Aristóteles