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GARÇON, CHEIRO E SABOR

JANUÁRIO, Sérgio S.

Mestre em Sociologia Política

 

Garçon [fr. Jovem], tratado por ocupação econômica, é um bom símbolo para se revelar o aprendizado de se viver em sociedade. Jovem, sem experiências suficientes para a vida adulta, o Garçon integra a vida social e econômica em ambiente aparente de pouca especialização. Ainda iniciante, o Garçon se coloca no momento decisivo de apreender conviver com os outros: recepcionar, abordar, ser gentil, anotar solicitações, prudência em se afastar, deixar as pessoas à vontade, encaminhar os pedidos; se reinserir sem perturbar, convir de acordo com demandas. Servir é um padrão de comportamentos e aceitação de regras sociais.

Ser Garçon, em formação para a vida social, é tornar-se um membro empático nas interações, nos convívios. Garçon é o ser social que esquece de si e de seus desejos para servir aos outros. Todo o cardápio social está ajustado a regras comportamentais e padrão ético bem definidos, com acordos tácitos precisos, afeição e cuidado. De sua vez, recebe gratidão, remuneração, dádivas, bem-estar, agradecimentos. Atender bem e ser bem atendido são parâmetros de respeito entre os agentes sociais. Servir é ter respeito aos outros e, ao mesmo tempo, ser respeitado.

O Garçon precisa perceber os outros, entender os outros, compreender os outros, interpretar os outros. Para o Garçon os outros constituem sua importância de pensar, de agir, de sentir, de ser. Garçon é um ser empático. Servir é conviver, é aprender, é apreender. Um processo rigoroso de socialização juvenil. Para o Garçon, servir não significa se subordinar ou se imaginar inferior, mas assumir um papel social em relacionamentos de compreensão e respeito social. Ter empatia é assumir respeito ao outro.

E há aqueles que vivem em telas, em seu mundo próprio e autogerado, editando a vida para simular plenitude individual e social. Na vida em telas os outros são totens, seres editados distantes, uma visão sem toque, em compilação particular, sem condição de conviver a convivência genética. O Garçon é o polo oposto: aprende que sua razão de existência está nas relações pessoais diretas de interação e integração sanguínea: ali há cheio, cor, movimento, expressões, sorrisos, angústias, tempo que passa, cadeira que range, talheres que tilintam, fome, noite e dia. O Garçon não sofrerá os resultados do “congelamento social”.

Este padrão de “congelamento social” tornara-se fundamento de socialização de jovens e adultos. As redes sociais da internet construíram um mundo próprio para cada navegador, cujo toque se faz por teclado, cuja imagem tem único enquadramento e profundidade; compartilhar se faz em processo distanciado, sem fraternidade física [embora possa haver instantâneos emocionais terminados pela mudança de site].

Há muito constrangimento em se revelar a “vida como ela é”, dura e cheia de percalços, buracos e gritos, desavenças, falar e agir contraditórios, descontroles emocionais, choros e deselegâncias, desordens e desorganização, cabelo mal arrumado e corpo desencontrado. As redes sociais estimulam o distanciamento da vida desejada editada e dos sorrisos arquitetados, em relação aos sofrimentos vividos e sentidos duramente na carne e na psique.

O Garçon encara as interações e as pessoas mais diferentes com respeito à vida como ela é: estar entregue à realidade carnal. A vida sem filtros tem cheiro e sabor!

Sugestão de Trilha Sonora: SONÍFERA ILHA

Artista: TITÃS

Autor: HERBERT LEMOS VIANNA

Álbum: NHEENGATU AO VIVO

Ano de Lançamento: 2015

Crédito de Imagem: PINTEREST



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