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DIAS SEM FIM

JANUÁRIO, Sérgio S.

Mestre em Sociologia Política

 

O destino da Dinastia Bragança se cumprira em 1808, ao chegarem em Salvador [BA] em janeiro ensolarado. Os traços para a transformação da Colônia em país independente têm seus primeiros contornos. Enquanto Portugal ficaria entregue a uma Regência Administrativa, a Colônia, sustentação financeira e refúgio da Família Real, transformaria sua própria posição política. A única colônia que ainda sustentava a metrópole, agora reveste-se de cores de centro do poder imperial.

Em fuga da fúria napoleônica que avança sobre os domínios dos reinos europeus, sob proteção militar inglesa, a Corte acorda já em sol alto com a necessidade de criar um Estado, uma organização política para as capitanias, para a população que cresce, para a separação entre camadas dominantes e os subalternos. E no tardar do dia ainda resta a necessidade de gerar as bases econômicas de uma nação que faz parir seu próprio nascimento, não sem contrações.

A primeira e permanente contração é o sentido megalomaníaco da formação dos representantes do Estado. Os músculos do corpo político logo sentiram o primeiro golpe: os fugitivos lusitanos, que sempre beberam de leite colonial e comeram às custas do Estado [impostos], desempregados, passam a pôr as mãos nas “tetas” do governo. A modernização pretendida pelo liberalizante Marquês de Pombal, fica à mercê da força e dos vícios de Lisboa. Não há rompimento com o passado: Dom Pedro I jamais seria visto como um conspirador, traidor familiar, conquistador da liberdade brasileira, herói nacional.

A abertura dos portos desenhou os rascunhos do crescimento e liberdade das indústrias, a despeito das âncoras pesadas das tributações. Os porões do Estado eram enriquecidos mesmo diante de abalos econômicos. Pestes e doenças se lançavam sobre a população e, diante dos ocasos, o Rei e seus ministros andavam de costas. Essa era a maneira de entender que “o pior já teria passado”. Os métodos de produção inibem o crescimento e as reformas políticas anticolonialistas são extraviadas entre as mãos de quem decide. A dominação patrimonial do Estado diante do mercado é a trava do desenvolvimento econômico.

O Rei, pouco astuto, com pensamento colonial, declarações distantes da realidade diante de seu nariz, acompanhado de fidalgos sem honra aristocrática, pensa, como demente, na manutenção permanente da coroa sobre sua cabeça. Se não tem apoio interno suficiente, busca amigos aparentemente poderosos: infratores políticos que não aceitam derrotas eleitorais e delinquentes militares que encomendam guerras.

O Rei e suas honrarias ocas, arremedo de um simulacro de força, dissemina ridículos, sempre com pompas para fotos e, ao passo seguinte, despreza os que sofrem desastres de terra, ignora sua própria ignorância, zomba de sua própria piada, e declara solidariedade aos que impõem a delinquência da guerra.

Ainda sem proclamar sua própria Independência, vivendo de fachadas ocas, há ao menos o sentimento de ser brasileiro, componente de unidade, elemento de uma nação, indispensável ao Estado. Os dias coloniais parecem nunca se pôr!

 

Sugestão de Trilha Sonora: A CANÇÃO DO SENHOR DA GUERRA

Artista: LEGIÃO URBANA

Autor: RENATO RUSSO

Álbum: MÚSICA PARA ACAMPAMENTOS

Ano de Lançamento: 1992

Crédito de Imagem: PINTEREST



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