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BRUNCK, O SÍNDICO

JANUÁRIO, Sérgio S.

Mestre em Sociologia Política

 

Brunck foi eleito como síndico do Condomínio “O Sol”. Mantinha relação desconcertante com os condôminos por atuar como se estivesse em luta permanente. Trazia de sua empresa a experiência da concorrência e do lucro. O Mercado, como uma instituição que atravessa cada um e sustenta parte da História da Humanidade, para Brunck, foi sempre a forma de viver e de orientar tudo na vida. Brunck expressava seus desejos na forma como se relacionava com as pessoas: o domínio e a capacidade de comandar tudo o que estava ao seu redor.

Brunck, em sua movimentação autocrática, não conseguira interpretar as formas segundo as quais a Política e o Mercado se assentam na vida humana. Enquanto a Política é o fórum de coletivização [lei para todos, impostos para todos, decisões políticas para todos], o Mercado fia o tecido da distinção, da diferenciação, da seletividade, do indivíduo individualizado. A mistura dos fundamentos da Política e do Mercado é o berço que embala a prepotência, a arrogância e severas condutas personalistas.

Brunck causou desconforto e fez sacudir as relações condominiais naquele leste. Considerava que poderia determinar um conjunto de referências de comportamento e alterar estruturas de convivência estabelecidas há muito no decorrer das transações sociais entre os moradores. O ápice de sua postura se revelara quando impôs aos moradores a forma segundo a qual deveriam limpar suas residências e as formas de relacionamentos dentro de cada unidade habitacional. Cada um deveria seguir exigências estabelecidas sem critérios objetivos, obscuros, sem consulta aos condôminos, e de acordo com situações descompassadas mostradas em tabelas coloridas. Como Brunck se manifestava de modo autocrático, valia o que acredita. Seu pensamento era suficiente, suas crenças deveriam valer para todos e seus desejos eram espelhos de verdades não enxergada pelo resto de “O Sol”.

Brunck passou a impor a quantidade de vezes que uma unidade habitacional deveria ser limpa no mês, quantidade e tipos de produtos, quantidade de horas, a cor dos sacos de lixo a usar etc. Os moradores ficaram perplexos pela atitude e abismados pela punição: sobretaxação no valor do condomínio. Um a um os moradores foram conversar com Brunck para entender a origem desse “infortúnio” e os motivos desse “desalento”. As respostas dadas foram desencontradas sobre a imposição de “Limpeza Brunck”.

Não era possível deslizar pacificamente naquela condição e os condôminos passaram a trocar informações entre si, a se aproximarem e a criar rotas de convivência nos corredores onde se encontravam. Não admitiam que Brunck pudesse impor a forma de viver em cada unidade. Como dependiam uns dos outros para viver em paz, passaram a se encontrar mais vezes. Conheceram-se mais. Tinham problemas a resolver. Alguns podem ser resolvidos com conversas em esforço orientado aos problemas e não aos indivíduos: estes podem ser eliminados. Há os que podem ser evitados com respeito mútuo entre os envolvidos e planejamento comum. Há problemas que não podem ser evitados e nem eliminados, o que condiciona processos adaptativos, como efeitos extremos da natureza. Brunck recuara em momentos decisivos ainda que insistisse em algum tipo de regra de limpeza. Momentos difíceis foram gerados e todos passaram a pensar intensamente sobre suas formas de viver em condomínio. Ninguém aceitou que outra pessoa poderia dizer como limpar sua casa.

 

Sugestão de Trilha Sonora: W BRASIL

Artista: JORGE BEN JOR

Autor: JORGE BEN JOR

Álbum: BEN JOR

Ano de Lançamento: 1995

Crédito de Imagem: PINTEREST



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