A AGENDA ULTRALIBERAL VERDE-OLIVA (AURI SACRA FAMES)
GUERINI, Eduardo
Mestre em Sociologia Política
Tudo já foi dito uma vez, mas, como ninguém escuta, é preciso dizer de novo (André Gide)
A eleição de Jair Bolsonaro em 2018, marca uma virada histórica do Brasil para direita, uma onda liberal-conservadora começou a ser construída nos tremores sísmicos de junho de 2013, momento que não foi devidamente apropriado por movimentos populares e partidos de centro-esquerda.
O petismo se esgueirou entre a explicação e surpresa, com desdém da incompreensão daquela massa da população que foi beneficiada por políticas inclusivas associadas com acesso ao consumo. Nada prosperou após 2014, culminando na transição para um governo tampão, com agenda liberal orquestrada sob a batuta da agenda anticorrupção.
A sede de poder produziu a cegueira histórica dos partidos envolvidos na escandalosa rede de pilhagem do Estado brasileiro, com enriquecimento passivo ou ativo de inúmeros representantes da política tradicional. A guinada rápida ao governismo de ocasião intrincada com o “presidencialismo de cooptação” fez escola no MDB, PT e PSDB, posteriormente, os partidos políticos foram irremediavelmente destroçados por ações antissistemas e seu “candidato outsider”.
A perda do capital político-eleitoral do líder carismático/populista de centro-esquerda (Lula), potencializou a ascensão no palco da política nacional, do polo oposto – um líder populista de direita (Bolsonaro). Ainda que, se relativize o despertar dos liberais e conservadores no universo do eleitorado brasileiro, a campanha de 2018, sepultou a velha polarização (PT/PSDB), as conquistas da inclusão pelo consumo (temporárias), a conciliação de classes, o presidencialismo de coalizão, estruturas carcomidas de coligações para governabilidade que na atualidade são impiedosamente substituídas por uma agenda ultraliberal que desqualifica, quando não menospreza o trato institucional da republiqueta tupiniquim.
As trilhas desenhadas na etapa transicional da democracia brasileira, sob a égide da “Constituição Cidadã” de 1988, são vagas lembranças do século passado, um desenho institucional mal traçado do que se convencionou chamar Estado de Bem-Estar Social. A política econômica, moldada entre o fiscalismo rastaquera e monetarismo bastardo, produziu um neoliberalismo envergonhado dos sociais-democratas, uma socialdemocracia subliminar do petismo, a democracia de fachada do medebismo, agora confrontadas pelo turbilhão ultraliberal conservador do bolsonarismo.
Novamente nos envolvemos na ideologia do curtoprazismo (resolver todos os problemas estruturais no espaço de um mandato presidencial), na política monetária que adota soluções antiquadas para problemas novos, no fiscalismo que enreda o Estado brasileiro na encruzilhada da paralisia de sua máquina ministerial (shut down).
Um deserto de ideias que sucumbe em sucessivos lançamentos de ensaios para reformas estruturais urgentes – reforma previdenciária, reforma tributária, reforma administrativa para o setor público, reformulação do pacto federativo, desregulação das atividades econômicas, descentralização orçamentária (Mais Brasil, Menos Brasília), inúmeras propostas que não foram pactuadas no processo eleitoral. Tal agenda em processo de implantação é defendida como o “Santo Graal” para retirar a economia brasileira da letargia, ungida pelos agentes de mercado e pela teocracia do pentecostalismo da miséria. É a “Auri Sacra Fames”, ou, a fome sagrada por dinheiro/lucro que move os apoiadores da agenda ultraliberal sob a batuta de Paulo Guedes.
Os poderes soberanos de superministérios objetivam reduzir a intervenção estatal, focado na economia de contingenciamento e cortes. A peça orçamentária é limitada por um garote fiscal sem precedentes. Nossa riqueza é vilipendiada sem rodeios, fruto da imperiosa necessidade de satisfazer os desígnios de especuladores de ocasião e investidores ávidos em privatizar e internacionalizar nossa recursos naturais, nossa riqueza mineral, nossa energia, os bens e serviços públicos . A mercantilização dos bens e serviços públicos, destroça a saúde universal, a universidade pública, a segurança pública, a assistência social, os programas assistenciais, todos sem exceção serão fruto da cobiça concorrencial dos fundos de pensão e investidores especulativos.
A dívida pública será reduzida pela conversão de parte das reservas internacionais, para abater parcela do volumoso passivo estatal com uma taxa de juros apetitosa. O foco é zerar um suposto déficit público a ser zerado, cuja conta tem como maior rubrica, os juros da dívida que alavanca os resultados financeiros dos maiores bancos nacionais. Acrescenta-se as concessões das áreas do pré-sal, distribuídos pela União, Estados e Municípios. Um naco da Eletrobrás também servirá para o belo jantar dos fundos de investimentos nacionais/internacionais.
No caso dos movimentos sociais, essencialmente, o movimento sindical, movimento dos trabalhadores sem-terra, assim como, associações identitárias em prol das mulheres, negros, ambientalistas, nada melhor que promover uma criminalização, com proposta em tramite que tratará todos os movimentos reivindicatórios como terrorismo contra o governo ungido por Deus e pelo voto popular.
O fascismo societal que se embrenhou nas redes sociais, se disseminou no cotidiano dos brasileiros, com todo o populismo liberal-conservador do nosso “Trump dos Trópicos”, que particiona a sociedade em pessimistas e otimistas. Para os otimistas, a defesa da agenda ultraliberal, é potencializada pela esperança escoltada por um esquadrão verde-oliva, com laivos que teremos um “Prá frente Brasil” no século XXI. No caso dos pessimistas, o fundo do poço é desenhado pela retração econômica global, descrita nos relatórios dos organismos multilaterais.
Na divisão polarizada de otimistas e pessimistas, nada melhor que ser um saudosista romântico, sem direitos ou garantias, ostentando uma carteira verde-amarela na fila do exército de desempregados, empreendedores por conta própria, uberizados por natureza, entoando aquele velho hino: “Este é um país que vai pra frente. Ou, ou, ou, ou, ou. Este é um país que vai pra frente. De um povo unido de grande valor. É um país que canta trabalha e se agiganta. É o Brasil do nosso amor.”
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Este é um país que vai pra frente. De um povo unido de grande valor. É um país que canta trabalha e se agiganta. É o Brasil do nosso amor.